quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Tale for Thais


I walked when I saw a guy in middle of street. He wanted stop any car. He shaked his hands, put his in pray. He claimed for help. I saw this guy and I thinked: What’s happen? Does he need help our Is it a blast? I’m afraid of him, but this is baloney.

I took a sip of courage and I approach the guy. I asked about occur, about his tears and his despair. Amid tears, the guy tries to tell me about your pain. His mother is in a hospital with cancer, and says he learned today that she will die. He cries again.

I speaked with him. I explained that today has many forms of healthcare, and I said: You need keep calm. Your mother is alive. But, what your name and where do you live?

The guy was disoriented, his words were disjointed and their answers were confusing. However I managed to extract from him the district of residence and cellphone number of his sister. I called his sister and I told about his brother and his emotional state. I promised for her that I put him in public car to home.

After, I walked for my home. When I arrived I was one happy reception. My daughters were preparing one birthday cake to me. I gone to restaurant in the neighborhood, pizzeria, and I waited for my guests. I had a nice night.

However, when I stayed in home I couldn’t forget the guy, his tears and he arrived in home. I called for his sister. She thanked me and calmed me down saying that he was at home and asleep.

I thanked God for this, because in the moment I met the guy I was so happy that I was afraid of happiness. I thanked him for the opportunity and the demonstration that it’s need very little thing to make me feel good about myself.

The choice about the name of this tale occurs because Thais always used to say me that I was a very important person and I didn’t believe.

(wrote by Simone da Silva Figueiredo em 2012/dec/19)

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Homens e Mulheres



Numa manhã das férias de verão, na casa de praia, a mãe e o seu casal de filhos acordam. Muitos preparativos, após alguns dias de chuva o sol anuncia que veio para ficar. As crianças com 10 anos estão animadas mediante a possibilidade de sair de casa e ter um dia divertido finalmente.
_ Marcia, venha e me ajude a por a mesa do café da manhã, a arrumar as camas e a separar o lanche da praia.
_ E o que meu irmão irá fazer?
_ Nada.
_ Por quê?
_ Ele é homem.
“Deus espera a mesma fidelidade de ambos os sexos, e que a premiará de forma idêntica” (Corão).

...

_ Meu caro irmão de fé, eu fico muito feliz com a possibilidade de entrares para nossa família. Você já é uma pessoa extremamente querida por todos nós, sua esposa é amiga da minha esposa e nossos filhos se dão bem. Para mim é um grande presente o destino dessa união. Basta apenas que acertemos o dote.
_ Claro. A felicidade desse momento também envolve o meu coração. Conversei com minha esposa e ela aceitou muito bem essa boa nova. Defino como dote para receber sua filha em minha casa, na nossa família, joias no valor de dois camelos de bom porte.
_ Mas, esse preço é elevado demais.
_ A sua filha é muito preciosa e segundo o profeta o valor de uma mulher excede em muito o das joias preciosas.
“O valor de uma mulher excede em muito, o valor de jóias preciosas.” (Sura)

...

Numa estrada que serpenteia uma montanha escarpada com uma das faces voltadas para o mar um casal caminha. Na conversa relatam os problemas da casa, dos filhos e do casamento. Os pontos de vista divergem e eles iniciam uma discussão acalorada. Em determinado momento o solo abaixo dos pés do homem cede e esse cai segurando-se na perna da esposa para não cair. Pede socorro. No entanto, a esposa estava muito magoada e pronta a deixa-lo morrer. O homem ao perceber a intenção em seu coração grita.
_ Querida, me desculpe. Você tem razão.
Ela o puxa para cima e o beija.
“O homem sábio é forte, e o homem de conhecimento consolida a força.”  Provérbios 24:5

Jardim


No Jardim uma conversa se inicia.
_ Oi. Meu nome é Vida. E o seu?
_ Morte.
_ Eu nunca conheci alguém chamado Morte. Eu tenho muitos anos. E você?
_ Eu também, mas acho que sou mais novo.
_ Qual o nome da sua mãe?
_ Eu não tenho mãe. Tenho apenas Pai.
_ E, eu também. Mas, tenho um monte de irmãos. A minha irmã mais velha se chama Luz e o meu irmão Céu.
_ O seu Pai dá nome esquisitos para os filhos.
_ Olha quem fala! O seu também.
_ O meu nada. Eu sou filho único. Ele só deu um nome esquisito, o meu.
_ O nome do meu Pai é Deus e do seu?
_ O nome do meu Pai é Destino.
_ Morte, será que os nossos pais sabem que estudamos juntos?
_ Não sei. Mas, daqui a pouco não estaremos mais estudando aqui.
_ Por quê?
_ Eu vim te buscar.
_ Morte, tem negociação? Dá para ser outro dia?
_ Claro que não.
_ Então, tá. Vamos logo. Quero conhecer seu Pai.

Morte e Vida saem juntos do Jardim. Caminham pelas ruas e chegam à casa da Morte. Destino, pai de Morte, espera a ambos à porta. Os convida a entrar. Dentro da casa um delicioso cheiro de frango assado com purê de maças. Almoçam calmamente juntos e felizes.
_ Senhor Destino, porque pediste a seu filho que me trouxesse aqui? Porque hoje? Porque eu?
_ Querida, o meu filho estava precisando de um pouco de vida. Trouxemos você para nos alegrar um pouco. Nada demais. Nenhum grande motivo.
_ Senhor, eu terei de ficar aqui por muito tempo?
_ Calma, Vida! Seu Pai sabe que estás aqui. Ele sabe de tudo. Assim que Ele achar conveniente virá lhe buscar. Que tal aproveitar um pouco do tempo que estás aqui?
_ Como?
_ Você sabe como morrem os elefantes velhos?
_ Não.
_ Se isolam dos outros e deitam num lugar calmo esperando pelo meu filho chegar. Ele sempre brinca um pouco com eles e depois subindo em seu dorso os traz para nosso zoológico particular. Gostamos muito de elefantes e temos muito carinho com os mais velhos.

Batem a porta e o Senhor Destino vai atendê-la. Seja bem-vindo, Deus, pode entrar. Avisarei à sua filha que chegaste.
_ Vida, venha até a sala. Seu Pai chegou.
_ Papai. Gostei muito do Senhor Destino e do meu novo amigo a Morte. Mas, porque deixaste que ele me trouxesse até aqui? Não tem medo de me perder?
_Filha, Eu sou aquele que tudo vê e pode. Nunca conseguirei te perder. Você por outro lado é aquela que precisava conhecer melhor o Senhor Destino e seu filho, Morte. Conhecer esses dois fará aumentar o seu respeito por si mesma. Isso é sempre importante de se aprender. Essa foi a lição de hoje. Agora, vamos para casa. Despeça-se dos seus novos amigos.
_ Obrigada pela tarde, o almoço estava delicioso. Espero retornar a vê-los.
_ Demorará mais estaremos todos juntos novamente. 

Apocalipse



E Deus limpará de seus olhos toda a lágrima; e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor; porque já as primeiras coisas são passadas.
Apocalipse 21:4


Ano 2500 de Nosso Senhor. Os céus se tornaram de um vermelho incandescente após o último desastre nuclear. Os seres humanos se escondem em abrigos nucleares abaixo da superfície. Comida, água e até o ar estão racionados. A reprodução humana está sendo controlada com mãos de ferro, não se permite mais os relacionamentos sexuais, todas as crianças são produzidas. As fábricas de gente produzem o ser humano segundo a necessidade da indústria. O Just in Time alcançou também esse patamar.
A Internet é o único espaço ainda livre de transição de ideias. E, nela, os profetas do apocalipse se multiplicam tanto quanto as ratazanas nos abrigos underground das cidadelas. Declamam o fim dos tempos. Pregam a vinda do profeta, o toque das trombetas e, apoteoticamente, o fim dos tempos.
Hoje, no terceiro dia do quarto mês do ano, o meu mundo acordou energeticamente diferente. Tudo está eletricamente calmo. O silêncio grita por problemas. E a pele se arrepia indicando um sentido nisso tudo que o meu cérebro não consegue formalizar.
O mundo parou.
Nenhum som. Nenhuma pessoa. Nenhuma indicação de existência de vida.
Pressinto, esqueceram de mim neste intervalo de tempo entre o hoje caótico e o amanhã desconhecido. Mas, se o mundo parou o tempo deixou de existir. O tempo invenção da serpente quando deu a maçã à Eva e a convenceu à enganar Adão. O tempo promulgado por Deus quando disse ao homem que seguisse o seu caminho e obtivesse seu sustento entendendo a natureza e o seu ritmo.
Se o mundo parou. Não. O mundo parou! Logo, o apocalipse chegou. O que irá acontecer comigo? Aonde está o tribunal celeste com sua horda de anjos a me julgarem? Cadê o livro aonde está escrito tudo aquilo que de bom e ruim eu fiz? Aonde estão as pessoas que enganei e me enganarão? Cadê aquele padre que me disse que se eu não fosse bonzinho eu não iria para o céu e, por outro lado, que eu padeceria no inferno até o fim dos tempos?
Deus!
O tempo parou e você não chegou!
Céus! Que barulho é esse? Senhor não sabia que eras tão audível assim e tão fácil de marcar uma audiência. Se eu assim o soubesse já o teria feito.
Filho!
Mãe!
Calma. Apenas saí e fui à padaria comprar um pão. Porque você está tão assustado? Viu outro filme de ficção ontem? Acalma-te. O céu continua azul, o ar ainda é respirável e ainda moramos no 15º andar e não no subterrâneo.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

O Padre


Nasceu o filho. Graças a Deus. Após dar ao marido sete meninas, a mulher conseguiu gerar um menino. A continuidade do nome da família está garantida. As terras terão um varão a comandá-las. E a mulher terá o sossego, chega de tentativas.

O menino cresceu forte e sadio. Corria pelas veredas da fazenda, brincava com os novilhos, caçava passarinho e tomava banho de rio. Coisas de menino. Vida de fazenda.

O menino era como todos os meninos em quase todos os dias da semana. No domingo o menino mudava. Domingo era dia de missa. Domingo o menino acordava animado e acordava toda a casa. Não queria perder a missa. Queria ser o primeiro a chegar para poder sentar no primeiro banco. Seu sonho era ser coroinha.

No aniversário de oito anos a mãe lhe preparou uma surpresa. Contou-lhe que o padre o aceitou como coroinha. O menino era a pura felicidade. Saltitava, corria, falava e saltitava de novo. A mãe ordenou-lhe que sossegasse, pois ele iria ficar desarrumado para as visitas que estavam por chegar. Mas, criança liga para visita?

A vida seguiu com o menino virando rapaz. Durante a semana se dedicava aos estudos e aos afazeres da fazenda. No Domingo, se dedicava a Igreja. O pai preocupava-se com o tamanho da dedicação. Não conseguia concatenar e dar forma, mas tinha medo do desconhecido. Ou quem sabe, medo daquilo que ele mais temia. Não ter um varão em casa.

Aos quatorze anos o rapaz entra para o seminário. A mãe conseguiu ludibriar o pai com a história que o seminário seria um excelente lugar para o filho obter educação de primeira qualidade. Antes de se tornar padre ele sairia do seminário. Não perderia o filho varão, administrador das terras, herdeiro do nome da família.

Aos dezoito anos o rapaz se torna padre. Assume a paróquia das cercanias de sua fazenda. Conhece a todos, mas foram quatro anos. Como seria recebido? Como seu pai absorveria a notícia, as perdas. Como fazê-lo ver que ele tem muitos prêmios, tesouros e que essa era uma benção disfarçada.

O tempo passa. O trabalho de padre transforma o rapaz em homem. Um homem cheio de princípios, com um sorriso amável para todos e bons conselhos para quem lhe procura.

Certa tarde adentra a nave da igreja uma moça da comunidade, segue direto para o confessionário. Conta ao padre que a vida não tem mais sentido, pois seu noivo abusou de sua confiança, ela não era mais pura. Para piorar a situação estava grávida, no entanto o meliante declinou de qualquer possibilidade de auxílio ou conversa. Sentia-se perdida. Mediante a todo esse quadro optou por se retirar da vida, pois não daria esse desgosto aos seus pais. E que só ele, o padre, saberia os reais motivos de seu suicídio. O padre tenta demovê-la de seus intentos, mas percebe que nada consegue além de que ela reze duas aves-maria.

A noite, no quarto, a moça toma vidros de calmantes e outras drogas. Promove um coquetel medicamentoso em seu estomago. A cabeça gira, o giro das tristezas infinitas, o giro das certezas fatídicas. Uma sombra assistia a tudo da janela. E antes que ela desfaleça, abre a janela e entra. A moça vê o animal enorme, peludo em pé nas patas traseiras em seu quarto. Seu descomunal tamanho e seu fedor de cachorro molhado a atordoam, a aterrorizam. Em choque ela o observa sem esboçar reação. E num rápido e certeiro golpe, o animal arranca-lhe a cabeça, se vira e sai pela janela aberta. Não deixa nenhum vestígio de sua presença, além do brutal assassinato.

O padre na sacristia ora. Senhor, Meu Deus, obrigado por permitir que eu chegasse a tempo de impedir a morte por suicídio. Receba a jovem em sua morada e explique a ela meus motivos. Amém.


Escrito por Simone da Silva Figueiredo
(em 13 de Novembro de 2012)

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Cordel


Seu nome é Luiz Gonzaga,
o famoso rei do Baião.
Nasceu em Pernambuco,
é o nosso rei do sertão.
Ninguém sabe quem ele é,
nós vamos explicar.
É um grande sanfoneiro.
E a moda vai pegar.
Quem conhece sua música,
sabe até cantar, a famosa
Asa Branca e Xamego
vão bombar.
Tal pai, tal filho,
Gonzaguinha, Gonzagão.
Parece até irmão,
Mas é filho do coração.
De 1912 a 1989,
Luiz viveu.
Seguindo o rumo de sua vida
e logo ... faleceu.



Escrito por:
Luiza Figueiredo de Andrade e
Rebecca Randolph C. S. de Souza
______________________________________________
Esse cordel foi escrito por duas amigas, Luiza, 10 anos, minha filha e Rebecca, 10 anos, colega de sala. Ambas estão no 5º ano do Ensino Fundamental do Educandário Madre Güell. A professora Anne solicitou um trabalho sobre Luiz Gonzaga e as meninas entregaram essa preciosidade.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Plutão

A morte
O casal Mitos, o empresário Cronos, de 65 anos, e a esposa Réia, de 62 anos, foi morto na noite de sexta-feira num assalto à empresa de transportes, localizada numa das saídas da cidade. As informações da Polícia Civil são de que três homens armados renderam o vigia da sede da empresa que estava de plantão. Os assaltantes amarraram o vigia e o prenderam no banheiro da guarita, dirigiram-se para o interior da empresa em busca do dinheiro guardado no cofre. Há indícios de troca de tiros, mas as únicas vítimas fatais foram o casal. O chefe da segurança particular do casal se feriu e recebe atendimento no hospital, mas não corre risco de morte.
O casal estava trabalhando na sede administrativa. Por volta das 20 horas, ouviram tiros no corredor. Cronos abriu a porta para averiguar o ocorrido e foi alvejado com três tiros, sendo dois no peito e um na cabeça. A esposa, Réia, tentou socorrê-lo, mas os bandidos invadiram o escritório para chegarem ao cofre, e, ao encontrarem Réia, os bandidos atiraram nela também - dois tiros na cabeça. Essa foi a versão dada pelo delegado Hecate, da Polícia Civil, da delegacia próxima ao incidente, após a apuração dos fatos junto ao vigia e os seguranças do casal. Os assaltantes fugiram levando alguns dólares do cofre, celulares e notebooks.
O casal não teve a chance de ser socorrido. Quando a ambulância chegou ao local, os dois estavam mortos. Os corpos foram levados para o Instituto Médico Legal e devem ser liberados para o enterro no domingo. Segundo a assessoria de imprensa da empresa, o casal deverá ser velado em sua residência, na companhia de familiares e amigos e, depois, será enterrado no cemitério particular da família.

Cronos fora criado pelo pai, e sua irmã Réia, pela mãe. Conheceram-se quando Cronos tinha 30 anos, e Réia, 25 anos. Apaixonaram-se e casaram-se, sem se importar com os ditames sociais e o incesto. Tiveram seis filhos, as mulheres Deméter, Hera e Héstia, e os homens Plutão, Poseidon e Zeus.
Cronos tinha um receio de que um de seus meninos lhe usurparia a riqueza, fundado na crença de que o crime do incesto lhe seria cobrado em algum momento. Por causa disso, assim que completavam cinco anos, ele os enviava para um colégio interno na Suíça. Assim, teria distanciamento suficiente para julgar do que eles seriam capazes. Réia conseguiu esconder o caçula – Zeus até que ele tivesse quatorze anos. Zeus foi criado perto da família, das irmãs e do pai. Cronos se apaixonou pela inteligência do rapaz e, quando soube que fora enganado, não sentiu raiva da esposa, na verdade, se sentiu agradecido.
Os outros dois rapazes, Plutão e Poseidon, retornaram ao seio familiar quando completaram vinte e um anos. E, Cronos – o pai, os colocou à frente dos negócios da família. A empresa de transporte prosperou com a injeção de ânimo, se estendendo do ramo rodoviário para o aeroviário, marítimo e no transporte em subterrâneos – passageiros (metrô) e de óleos combustíveis (oleodutos). As mulheres foram criadas junto aos pais, e a elas coube gerenciar as atividades sociais familiares.
Hera se dedicou a obras assistenciais voltadas a mães solteiras. Procurando criar formas de que essas mulheres ingressassem no mercado de trabalho, se profissionalizassem, criassem seus filhos e se tornassem mulheres atuantes na sociedade.
Héstia se dedicou às ações humanitárias, viajando pelo mundo, se interessando principalmente na conservação das famílias, criando condição para as famílias se manterem unidas.
Deméter se dedicou às ações ambientais e ao estudo do desenvolvimento de novas sementes transgênicas e a melhoria das condições da agricultura.
Essas ações empreendidas pelo lado feminino da família foram incentivadas pela mãe Réia. Cronos, a princípio, foi contra, mas vendo os resultados - o retorno de mídia, marketing e a tradução na elevação da margem de lucro das suas empresas - acabou por apoiar as ações.
No entanto, os anos de afastamento dos filhos, Plutão e Poseidon, pesavam demais na constituição de um sentimento familiar. Eles participavam das reuniões para resolução das questões das empresas, mas não compareciam aos eventos sociais e familiares com os seus pais. Praticamente eram estranhos nesta família. Sentiam-se em família apenas na presença um do outro.
Plutão, o filho mais velho, tinha um temperamento forte e taciturno. Não era de muita conversa nem era flexível com os erros alheios. Os anos que passou afastado do convívio familiar fizeram com que criasse conceitos próprios de honestidade – que feriam o conceito social e os de qualquer pessoa. Plutão conduzia a parte da empresa que lhe cabia e tentava expandi-la e fazer dela uma fachada para seus negócios de tráfico de obras de arte.
Poseidon, o filho do meio, tinha o mesmo tipo de temperamento, mas não o mesmo conceito de honestidade. Não interessava a ele nada que não fosse honesto. Essa era a única área de divergência entre ele e Plutão. Na direção dos negócios familiares, era tão brilhante quanto Plutão e ambos se apoiavam nas tentativas de expansão empresarial.
A notícia da morte de Cronos e Réia não abala emocionalmente Plutão e Poseidon. As mulheres sentem a morte dos pais, mas reagem com tranquilidade. Apenas Zeus aparenta tranquilidade e um pouco de alegria. Mesmo com esses sentimentos controversos, todos comparecem ao velório e ao enterro dos pais.
Neste momento, a família toma conhecimento da união de Zeus e Deméter. Casaram-se e mantiveram o relacionamento em segredo, pois o pai não queria a repetição do fato na família e ameaçava a todos com a deserção. Todos sabiam que Deméter tinha uma filha, Perséfone, de 14 anos, mas ninguém sabia quem era o pai. A certeza se instaura ao vê-los juntos, pois a menina é muito parecida com o pai – Zeus. Compreende-se a alegria com a saída de Cronos da vida familiar por parte de Zeus: representou a liberdade de viver seu casamento.
Plutão e Poseidon percebem o que todos tomavam ciência: Zeus desejava a morte do pai. Ninguém percebeu que eles também tinham o mesmo desejo. Outra situação muito importante que ocorre no velório e no enterro dos pais é que Plutão conhece Perséfone. Ao vê-la, se encanta pela beleza da sobrinha.
Um mês depois do trágico assassinato, a polícia entrega ao Ministério Público o relatório conclusivo das investigações. O crime foi de latrocínio. Os três homens, ainda foragidos, invadiram o local, roubaram dez mil dólares, cinco aparelhos celulares, dois notebooks e assassinaram o casal Cronos e Réia. Não havendo indiciados devido aos autores do crime não terem sido reconhecidos, as investigações continuam no sentido de encontrar os suspeitos.
Quinze dias depois do relatório policial,, ocorre a leitura do testamento no escritório da empresa de advocacia da família.
O escritório da Toledo Advocacia localiza-se na Avenida Rio Branco, número 1. Num dos mais belos prédios da avenida, o escritório fica no último andar, permitindo de suas paredes envidraçadas uma magnífica vista da Baía de Guanabara, do porto e de boa parte do Centro do Rio de Janeiro. A reunião com os herdeiros fora marcada para as 15 horas de um dia de céu deslumbrantemente azul, o que favorecia a vontade de estar em qualquer outro lugar, menos naquela reunião. Foi com esse espírito que Plutão se dirigiu ao endereço.
Plutão chegou faltando dez minutos para hora marcada, ele desejava saber como estava os ânimos de seus irmãos e irmãs. Queria observar-lhes o comportamento a fim de espreitar-lhes a alma. No entanto, todos chegaram logo depois e de maneira leve. O taciturno era ele, apenas.
Às quinze horas uma moça alta e esguia, de expressão discreta, daquele tipo de quem não se consegue adivinhar os pensamentos, convida todos a entrarem no escritório do Senhor Alberto L. Toledo – dono do escritório, advogado com um currículo invejável e com a fama de honesto e vitorioso. Após todos se acomodarem, inicia-se a leitura do testamento. Cronos deixou tudo muito organizado.
As obras sociais constituíram uma empresa filantrópica de organização una e frente tripla, sendo que cada uma das filhas continuou responsável pelo que já havia iniciado. Essa parte foi compreendida como uma continuação de um trabalho já iniciado. Isso foi visto como uma consequência natural.
Dividiu em três partes a empresa de transporte, entregando-a aos filhos. Zeus herda a parte aérea e terrestre da empresa, ficando com o transporte sobre trilhos (metrô e trem) e o aeroviário. Poseidon herda a parte marítima da empresa, ficando com o transporte marítimo de longa distância (mercante) e com o doméstico (cabotagem). Plutão herda a outra parte terrestre da empresa, ficando com o transporte rodoviário e dutoviário.
Os bens pessoais: casas, carros, joias e objetos de arte foram rateados de maneira igualitária, segundo o seu valor de mercado, para as empresas que foram criadas.
Não houve dentre os filhos nenhuma surpresa quanto à divisão e também nenhum descontentamento. A vida segue. Eles, cada vez mais separados. E, no coração de Plutão, um rosto fica marcado.

O Mega empresário
O empresário Plutão Mitos, presidente da Hades, apresentou, nesta sexta-feira (19), mais uma aposta de negócios, a Orcus, em que a Hades está aliada com a Erebos Incorporate, empresa com atuação internacional em negócios de construção de novos modelos de transporte de luxo em mais de 30 países. Cada empresa entra na Erebos com 50% de capital e, de acordo com o CEO da nova empresa, Hipnos Sandler, a previsão de investimentos para os próximos quatro anos é de R$ 500 milhões.

Plutão assumiu a totalidade dos negócios herdados com feracidade. Mergulhou no trabalho de tal forma que a empresa começou a apresentar crescimento invejável aos olhos dos irmãos. Passou a viver na empresa, chegava às oito horas e saía à meia-noite. Almoçava os sandwichs solicitados aos restaurantes próximos. Dia após dia, imbuído da vontade de fazer a empresa crescer e sobrepujar a empresa, que era a principal do grupo na época do pai e que foi herdada por Zeus.
Nesse ritmo, foram consumidos da vida de Plutão seis meses. Nesse tempo ele colocou a Hades na mídia e fez o valor das ações subirem vertiginosamente. Com jogadas de marketing e empreitadas ousadas, como a aliança com a Erebos Incorporate. Agora se vê com a necessidade, a possibilidade e, sobretudo, a vontade de comemorar seus sucessos à frente da empresa. Contrata uma empresa de marketing a fim de verificar a melhor estratégia.
Entre as atividades propostas pela empresa uma festa na mansão por ele herdada. Abrir as portas do imóvel para alta sociedade e para mídia serviria como comemoração, demonstração de poder financeiro e bom gosto. Plutão se pega imaginando sua família, principalmente seus irmãos – o amigo Poseidon e o distante Zeus. Pensa, também, festa é uma boa ideia para relaxar, namorar um pouquinho.
Passam-se quinze dias e chega a noite da festa. Todos os preparativos feitos. Tudo pronto. Dez horas da noite e os convidados começam a chegar. Logo, aponta na porta Poseidon. Um largo sorriso se abre no rosto de Plutão, seu amigo chegou. Desce as escadas para recebê-lo pessoalmente, pois Poseidon, além de irmão, é seu melhor amigo. Cumprimenta o irmão e verifica que está acompanhado de uma linda mulher. Poseidon o apresenta à nova esposa. Logo, fica claro para Plutão que era apenas uma modelo/atriz querendo uma escada para o sucesso. Plutão também percebe que seu irmão tem conhecimento disso e que está se divertindo com a situação.
Mais algum tempo de festa chegam suas irmãs, Hera e Héstia, acompanhadas dos maridos. Lindas, de beleza ímpar, atraem para si os flashes dos jornalistas de plantão na entrada. Pois trazem o glamour ao ambiente esboçado em belos vestidos de alta costura assinados por Alexandre Herchcovitch e Ocimar Versolato. Respondem às perguntas acerca dos projetos da nova empresa de que são sócias, a nova empresa ganha o nome de Olimpiah – gestação de deusas.
Os últimos membros da família chegam. Zeus adentra o salão acompanhado de sua esposa - a bela Deméter e da estonteante Perséfone. Plutão não nutre bons sentimentos por Zeus, mas sua chegada lhe arrancou o fôlego, pois trouxe a sua memória o dia da leitura do testamento, e a mesma emoção em relação à sobrinha lhe toldou a visão. Há mais de seis meses atrás, ficou na dúvida se ela era imprescindível em sua vida. Nesse intervalo de muita labuta chegou a nem lembrar dela. No entanto, ao revê-la suas emoções reacenderam.
Plutão ficou inquieto, sua personalidade fria e calculista foi tomada de assalto por um novo sentimento que ele não entendia e que o atordoava. Plutão se esqueceu de que tinha de ir para o salão principal para fazer o discurso comemorativo. Ficou a observar a bela sobrinha nos seus quinze estupendos anos. Ficou se imaginando ao lado dela sentindo o frescor de sua pele e ouvindo a sua voz. Foi chamado pelo sistema de som.
Discursou para os convidados, lembrando a tristeza da retirada dos seus pais do seio familiar, mas pondo em destaque as conquistas empresariais do grupo. Falou rapidamente sobre o bom desenvolvimento das empresas de Zeus, Poseidon e das atividades sociais encabeçadas pela empresa das irmãs. Desse ponto em diante do discurso, tratou de falar de sua organização empresarial e dos planos para o futuro. O discurso foi um sucesso aplaudido pelos convidados. Em seguida, a atenção se volta para um show pirotécnico e à abertura da pista de dança.
A festa se tornou um rebuliço. Música de excelente qualidade, a pista cheia, e a bebida sendo consumida em grande quantidade. Plutão observa seu sucesso com satisfação. Enxerga, na pista de dança, Perséfone – a sobrinha, e resolve ir dançar com ela. Com duas taças de champagne se aproxima, e trocam os primeiros olhares. Dançam animadamente, uma, duas, três músicas. Até que ele a chama para sentar. Ela aceita.
Ao conversarem, as palavras fluem. Os assuntos se sucedem. Falam como se conhecessem, mas é a primeira vez que a oportunidade é apresentada. Quando a intimidade começa a crescer, Zeus se aproxima, se despede do irmão e leva a filha pelo braço. Plutão fica com uma sensação de vazio, de algo lhe ter sido usurpado. Retira-se para seus aposentos, para ele, a festa acabou.
Dia seguinte no escritório, são lidas as noticias da festa. Todas elas são de elogio. Nenhum incidente ocorreu. Foi de um sucesso irrepreensível.
O crescimento da empresa Hades foi incontestável e a sua maior expressividade nas principais bolsas de valores ratifica o trabalho de Plutão. Ao mesmo tempo, todo esse vigor serviu para encobrir as outras atividades.
Onze horas da noite adentra o escritório Harpia Papoulos. Homem de porte elegante e com mesma aparência dos amigos ricos de Plutão. Harpia adentra dando parabéns a Plutão pela festa bem-sucedida e se desculpando por ter faltado, mas tinha ficado enganchado numa bela mulher. Os dois riram da situação e Plutão contou algumas coisas que não sairam nos noticiários. Após essa introdução animada à conversa, se dirigiu para os assuntos reais que levavam Harpia à presença de Plutão. Ambos precisavam discutir como seriam os trâmites para a recepção de um novo quadro trazido do interior do Chile – uma obra de raro valor.
Plutão e Harpia chegam ao consenso – consenso firmado por Plutão - de que o artefato seria trazido pela rota Caronte. Como ficou conhecida a entrega ao seu homem de confiança em local a combinar diretamente com ele. Caronte informava a quem fosse negociar o preço definido por Plutão, apesar de todos os traficantes apresentarem a Plutão o projeto - as informações da peça a ser trazida – era ele, Caronte, homem de confiança, que finalizava as negociações. Todos tremiam ao ter de estar com ele. Plutão sabia e gostava disso. Sabia que a fama de Caronte garantia que ninguém lhe passasse a perna, e o tratamento que dispensava a Caronte e os régios pagamentos garantiam a sua fidelidade.


Os paparazzi
Perséfone ganhou um colar e brincos de esmeraldas de um admirador secreto. A desconfiança recai sobre Plutão Mitos, segundo a coluna “Babado”, da Revista “Isso me interessa”.
Sem citar nomes, Perséfone diz que ficou muito emocionada ao receber as joias. Somente homens apaixonados e que valorizam a mulher amada têm esse tipo de comportamento. Gostaria de saber quem me enviou as joias, que chamou de preciosidades. A Bela Perséfone manda recado dizendo que gostaria de agradecer pessoalmente.

Plutão leu a revista e toma conhecimento da repercussão em Perséfone de seu presente. Ficou orgulhoso da ideia. Pediu a um joalheiro de sua confiança as joias e que fossem entregues discretamente, garantindo o sigilo. Só porque dancei com a minha sobrinha em minha festa isso não significa que estou interessada nela. Mas, gosto que desconfiem de mim.
Plutão desceu as escadas de sua casa orgulhoso de si mesmo e resolveu se presentear com um belo café da manhã, chega de improvisos. Pegou o carro, decidiu ir dirigindo para o escritório. Usou o trajeto da orla, o dia estava maravilhoso. Resolveu encostar o carro, desabotoou o paletó e caminhou pelo calçadão. Após meia hora, parou para tomar uma água de coco, sentou-se num banco e resolveu observar o mar. Relaxadamente permaneceu em contemplação, até que uma voz o retirou de seus devaneios.
Ele se vira e vê a encantadora sobrinha. Fica maravilhado de encontrá-la. Ela prontamente, utilizando-se da malícia adolescente dos seus quinze anos, agradece pelas joias. Plutão, para se divertir, a questiona. Plutão questiona os motivos que a levam a pensar que seria ele o autor do presente. Ela fica sem graça. Ele, para socorrê-la, confessa. Desse momento em diante, os dois entabulam uma conversa. Demonstram a intimidade de um casal e olhares apaixonados. Plutão se envaidece com a conquista. E o amor que passa a residir em seu coração conscientiza-se de ser correspondido. Combinam um jantar para a noite daquele dia.
Plutão sente o dia se arrastar. Se normalmente para ele estar no escritório era uma adrenalina. Fechar negócios, pensar em novas atividades, escolher obras de artes, tudo isso o animava. Hoje, o dia se arrastava, seus pensamentos tinham uma única personagem, Perséfone.
A noite chega com um prazer indescritível. Ele se arruma no escritório, se vale do quarto executivo montado para seu conforto e, também, para diminuir a necessidade de casa. Banho, roupas, sapatos e tudo que se faz necessário – ele tem à sua disposição. Dessa forma, se arrumou com esmero. Optou por um terno preto, um Armani.
Chegou à casa da sobrinha com uma hora de antecedência. Estava muito ansioso. Mas, a casa de Perséfone também é a residência de Zeus. Como enfrentar o irmão nessa situação singular. Mas, ele deveria ser compreensivo, pois se casou com a irmã, sua irmã Demeter. Com o pensamento envolto nessas questões, ainda ficou um tempo pensando dentro do carro, que agradeceu ter querido sair pela manhã com um carro esporte, um discreto Toyota Celica GT-Four e não ser levado pelo motorista naquele enorme Land Rover LRX. Encheu-se de coragem e desceu do carro. Plutão foi recebido à porta e encaminhado à sala de estar.
Zeus o aguardava com um copo de whisky na mão. Externamente calmo, mas internamente desconfortável com a situação. Nada era evidente, mas tudo indicava o que estava acontecendo. Ele, com ciúmes da filha, não gostava da situação. Mas, seu irmão Plutão se desvencilharia com facilidade de suas acusações, pois não confirmou ter sido ele o presenteador, o admirador secreto. Encontraram-se na praia, têm interesses comuns, serão apenas amigos. Nada em Zeus conseguia fazê-lo acreditar nessa possibilidade.
Zeus e Plutão se cumprimentam. Zeus o parabeniza pela festa. Plutão pergunta como estão os negócios. Uma conversa sem intimidades, na qual ambos estudam as reações do outro. Enfrentam um ao outro com olhares de leões na cova. Perséfone adentra a sala. Lindamente vestida com um simples vestido azul caribenho. A beleza na juventude não necessita de muitos adornos para se mostrar. Perséfone passou o recado de que, como estava aos cuidados do tio, não precisava ter hora para voltar, iriam jantar e depois a uma festa sem hora para acabar. Contrariado, Zeus concorda.
Plutão e Perséfone entram no restaurante ΔFЯΘDITΣ TIS MILΘ, um discreto restaurante grego famoso pelos pratos divinamente preparados e por uma iguaria de ostras ditas afrodisíacas. Mesa reservada no canto, eles adentram o recinto e todos os seguem com os olhos. Veem uma beldade alçada à mídia naquela semana por causa de umas joias e um megaempresário, solteiro e cobiçado. Os paparazzi os fotografaram na entrada, mas, para o conforto de todos, foram barrados na porta. Após o rebuliço inicial, a calma se instalou novamente, todos voltaram suas atenções para seu próprio mundo. Plutão e Perséfone puderam se sentir à vontade para conversarem mais animadamente como na praia.
Perséfone lhe conta como foi ser por quatorze anos filha sem pai conhecido. Apesar de ela ter conhecimento de que Zeus era seu pai, teve de manter o segredo perante seus avôs, Cronos e Réia. Também contou que, diferente das amigas, ela tinha apenas um casal de avós, já que seus pais são irmãos. Plutão percebeu que a menina não tinha problemas com a relação incestuosa dos pais e se encheu de esperanças.
Findado o jantar, seguiram para uma danceteria. Dançaram bastante e lá pelas duas da madrugada se retiraram. Plutão se prepara para levá-la para casa, mas ela solicita um prolongamento da noite. Era sua primeira vez com liberdade de horário, não queria chegar tão cedo. Plutão a leva até a marina e pega o seu iate. Navegam sem destino, apreciando as estrelas e aguardam o amanhecer. Neste momento se beijam. Plutão percebe o quanto à menina se interessou por ele e fica envaidecido, mas tem noção do terreno minado em que está pisando. Decide retornar para terra com o iate e deixá-la em casa. Faria tudo direito.
Ao chegar com Perséfone, Plutão divisa Zeus em pé numa das sacadas da casa. Percebe pelo semblante carregado que o irmão pouco dormiu e que problemas aconteceriam. Caminhou junto a Perséfone para deixá-la na porta, mas esta se abriu primeiro. Um Zeus zangado com olhos de trovão os observava. Mandou que Perséfone fosse para o quarto e comunicou que Plutão não era mais bem-vindo, como se um dia tivesse sido. Perséfone entristecida obedeceu. Plutão, revolvendo seus ódios, partiu.
Entrou no carro e queria gritar de raiva, mas seu temperamento taciturno tomou conta dele. Depois a raiva suavizou-se e lembrou-se da bela noite vivida e o quanto foi correspondido. Ficou feliz e preocupado. Felicidade do amor correspondido, preocupação com a continuação desse amor. Resolveu dormir, o bom de se ter mais idade é o controle emocional e o saber que para tudo se tem solução, ainda mais quando se é muito rico.

O sequestro
Perséfone, filha do empresário do setor de transporte, Zeus Mitos com a sua irmã Demeter Mitos, encontra-se desaparecida. Saiu de casa para a escola e, em algum momento desse trajeto, ela desapareceu porque sua chegada não ocorreu. A escola fica no mesmo bairro.
A menina de quinze anos é a mesma que estava nas páginas dos jornais e revistas por ter ganhado joias maravilhosas de um admirador secreto. À época acreditou-se ser o tio, Plutão Mitos, que a teria presenteado por terem sido vistos dançando na festa de comemoração do sucesso das empresas herdadas por Plutão. Os boatos receberam reforços devido aos dois terem sido vistos jantando no restaurante grego, ΔFЯΘDITΣ TIS MILΘ, e depois numa balada.
No entanto, o sumiço da jovem obriga a polícia a pensar em quem poderia ter feito isso e se realmente foi o tio o autor do presente e do ato. O delegado Hecate acredita que precisa de mais elementos para responder às perguntas formuladas e que as investigações foram iniciadas. Inclusive refutou a possibilidade de o sumiço da jovem ter qualquer ligação com o assassinato dos avós, Cronos e Réia Mitos – os suspeitos encontram-se presos e aguardam julgamento.
Plutão chama ao seu escritório particular na área das docas o seu mais fiel serviçal, ele convoca Caronte logo pela manhã. Às seis da manhã, Caronte chega e encontra o seu patrão esperando-o.  Alinhado como sempre, discreto e calmo como sempre o fora. No entanto, uma certa ansiedade trai seu semblante. Tal emoção é externamente colocada como uma ruga de preocupação no semblante sempre liso. Caronte tenta entender o porquê dessa alteração, sem precisar avaliar muito conclui – esse sequestro tem razões pessoais envolvidas e não somente uma disputa empresarial entre os irmãos.
Caronte sempre soube do envolvimento entre Zeus e Deméter, sabia da filha. Com a morte de Cronos, o único empecilho à felicidade incestuosa do casal, a exposição pública do amor que os unia, se fez atuante. Perséfone é esse amor em carne e osso, paixão e luxúria. E a menina, no frescor da juventude, expunha todas essas emoções na sua beleza. Mas, até ver o seu patrão não tinha entendido o quanto era importante para ele. Não tinha entendido a motivação do sequestro. Mas, sabia que ele somente era chamado para os artigos mais raros e que precisavam ser tratados com o maior esmero, logo, foi muito cuidadoso com a menina.
Plutão se dirige a Caronte inquirindo como ocorreram os eventos do sequestro da menina, se houve testemunhas e se ela está bem. Caronte entregou seu relatório completo, informando que a menina foi colocada na sala especial para obras raras na casa principal. Imaginou que sendo essa sala de acesso exclusivo, mas contando com requinte e vista para o mar, seria um espaço ótimo para a menina por algumas horas até que pudesse estar com ele. A sala foi equipada com frigobar com comidas e bebidas típicas da idade e um micro-ondas para que ela pudesse aquecer o que lhe aprouvesse.
Plutão se despede de Caronte agradecendo pelo serviço prestado e pagando o combinado pelo serviço e uma gorjeta de 30% a mais. Caso precisasse de mais alguma encomenda, entraria em contato.
Dirige-se para o escritório, precisa ter uma rotina normal, receber a noticia do sumiço em meio a testemunhas idôneas. Sabia que pelo encontro com a sobrinha na semana passada e sua relação fria com o irmão poderia ser arrolado como suspeito. Tinha que impedir qualquer um de pensar nessa possibilidade. Pensou nessa saída, nessa forma de obter a menina para si após a conversa com o irmão. No mesmo dia em que deixou a sobrinha em casa pela manhã, no final da tarde Zeus veio procurá-lo em seu escritório. Ameaçou-o de revelar ao mundo as provas de que ele fora o mandante do assassinato dos pais. Não o fizera antes porque a morte deles foi providencial a sua vida, mas aproximação de sua filha o faria rever os conceitos. Discutiram acaloradamente. Ameaças foram trocadas. O ambiente ficou pesado.
Plutão sente sua mente divagar em direções antagônicas a todo momento. Sabe da necessidade de prudência, mas sente a paixão lhe toldar o pensamento e a vontade. Chegou ao escritório e uma das secretárias o notifica do sumiço da sobrinha. Plutão pede que liguem para casa de Zeus e se informe dos acontecimentos. Pede que a ligação seja transferida a ele. É atendido por sua irmã Demeter. Esta chorosa lhe conta que estão muito preocupados, pois Perséfone nunca foi de sumir, isso provavelmente era um sequestro. Mas, como ainda não havia nenhum contato, nenhuma pista a seguir,  nenhuma testemunha, logo, eram obrigados a esperar. Plutão se colocou à disposição para auxiliar no que fosse preciso, mas não iria até a residência deles, pois tinha discutido com Zeus – o temperamento de Zeus não iria permitir uma aproximação nesse momento.
Ao cair da tarde, Plutão disse que preferia continuar a trabalhar de casa. Chegando em casa, deu ordens de dispensa aos seus empregados. Foi banhar-se e arrumou-se com esmero. Estava ansioso, mas tinha que dar um intervalo de pelo menos meia-hora para que os empregados realmente tivessem se recolhido. Desceu ao quarto secreto.
Ao entrar no cômodo amplo com vista para o mar, encontrou uma menina triste e chorosa, assustada. Seu peito se encheu de dor e remorso por tudo que imputou a ela. Mas, se convenceu de que aquilo fora necessário. Perséfone correu para ele e o abraçou. Chorou, um choro convulsivo de todo o medo vivido estourou em seu peito. Plutão a abraçou e deixou que ela esvaziasse o seu core de todas as contrariedades. Mais calma, Perséfone indagou como ele a encontrou e como iria para casa. Plutão a soltou e explicou que ele era seu raptor e que o fizera para poder vê-la, pois Zeus o ameaçou. Ela, meio que surpresa, indignada e orgulhosa, questiona. Profere que bastava ele a procurar e perguntar os seus desejos – ela queria estar com ele. E assim a primeira noite do casal acontece.
Combinam que Plutão a levaria de volta à casa dos pais para dar noticias do seu retorno, que esta fora encontrada após ter sofrido um assalto relâmpago e que estão apaixonados e que ela passaria a morar com Plutão.
Zeus e Demeter ficarão felizes com o retorno da filha até o anúncio da união dela com Plutão. Zeus enfureceu-se e tentou atacar Plutão. Mas Perséfone interpôs-se e impediu o pai de cometer qualquer desatino. Demeter chorou copiosamente a partida da filha, mas esta prometeu, desde que seu pai permitisse, visitá-la sempre.
Perséfone retorna à casa de Plutão, que agora era sua também. Mas, calma e com os pensamentos arrumados, questiona a forma como foi engendrado seu sequestro e quem era aquele homem – taciturno, serio e amedrontador - Caronte. Plutão se vê obrigado a revelar a ela todas as suas atividades na área de interceptação de obras raras e lhe mostra o pequeno acervo. Perséfone se interessa e decide se inteirar de como cada parte da máquina funciona. Ela se coloca a par e à frente desses negócios.

Fim.
Escrito por Simone da Silva Figueiredo

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Sofia


Sofia é uma cobra. Mas, isso não significa que tenhas de temê-la ou de achá-la comum. Sofia é uma cobra que reside no Rio Matapi no Amapá. Sofia é uma cobra muito grande.
Sofia é filha da linda índia Icorã, prometida de Tupã. Icorã vivia triste por não poder escolher o amado, já havia sido prometida. Numa das noites, ao chorar às margens do Rio Matapi, foi seduzida por Tucuxi – um boto que se travestiu de cisne para se aproximar. Tempos depois deu à luz uma linda menina - Sofia. Com medo de ser desprezada na tribo jogou a menina ao rio. Tucuxi, arrependido do que fez e por amor a filha, transformou a menina numa cobra para salvá-la, mas não em qualquer cobra e sim na maior das cobras.
Sofia passou a nadar no Rio Matapi, protegendo os botos e os peixes de serem maltratados. Certo dia, Sofia parou para descansar e dormiu. Sofia está dormindo por tanto tempo que a seu redor juntou terra, a relva cresceu, árvores se desenvolveram e os passarinhos, que confiavam em Sofia, fizeram seus ninhos sobre ela.
Hoje, Sofia é a Ilha de Santana. Dizem que se você fizer silêncio pode ouvir o ronco de Sofia. E todos pensam que a vida boa pode acabar se Sofia acordar.

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Conheci essa história numa viagem ao Amapá no ano de 2005. Ao chegar em casa no Rio de Janeiro contei essa história a minha filha, Luiza, com então 3 anos e a minha afilhada - Ariane, com 5 anos. Ambas gostaram tanto da história que montaram um teatro de fantoches e encenaram a história para a nossa família e amigos. Tiveram de apresentar a peça por cinco vezes. Como resultado disso, Luiza se interessou por Teatro e fez um curso de interpretação. Hoje, Luiza tem 10 anos, gosta de ler e contar histórias.

Escrito em 25/07/2012 por Simone da Silva Figueiredo.

sábado, 14 de abril de 2012

Rafael

     Os dias estão cada vez mais conturbados. O nascimento de crianças ainda ocorre em número elevado e superior ao número de mortes. O treinamento de anjos da guarda é constante. A cada leva nova de anjos que chega vem junto o sentimento de início da jornada. Explicar o funcionamento do mundo, as regras de Deus e as consequências do balanço entre causa e efeito. Explicar que devem cuidar dos novos filhos do Pai com doçura e firmeza.
     Rafael era um arcanjo responsável por essa tarefa desde o início dos tempos. Se sentia renovado a cada turma que iniciava. E, se sentia demasiadamente feliz quando completava sua tarefa e entregava a missão aos anjos.
     Rafael sentou-se a fim de apreciar o brilho das estrelas e o amanhecer de um novo dia. O céu estava particularmente belo naquele amanhecer, como se o dia que se descortina fosse tão especial que merecia uma introdução a altura. De repente, uma conversa na Terra lhe chama a atenção.
   
     _ Mamãe quando o meu dente cair o anjo vai colocar uma moeda debaixo do meu travesseiro.
     _ Que história é essa menina? 
     _ Mamãe, eu ponho o meu dente debaixo do meu travesseiro. O anjo vem e guarda o meu dente
        e  deixa uma moeda.
     _ Quem te contou isso?
     _ Foi minha colega, na hora da prece. Ela me disse que isso aconteceu com ela, amanhã.
     _ Você quer dizer ontem.
     _ É mãe, ontem.
     _ E se o anjo não trouxer. O que você vai fazer?
     _ Eu nunca mais acredito em anjos.
     _ Minha filha, anjos não fazem isso.
     _ Mas, mas, mas, ... Ele fez para a Gabriela. Porque não vai fazer para mim?
     _ Minha filha, eu te amo e os anjos também. Fique calma.

     Rafael achou aquela menina muito inteligente e quis conhecê-la melhor. Apurou que seus pais se separaram quando ela tinha dois anos e que logo depois seu tio querido falecera. Ela tem apenas cinco anos, é muito sensível e que sente quando alguém precisa de carinho - e por isso acaba por abraçar estranhos na rua. A menina é muito levada, se machuca toda hora. A mãe dela é muito ligada à ela, devido a todas as dificuldades que envolveram a gravidez e o parto.

     Rafael se apaixonou por aquela menina. Decidiu ser seu novo anjo da guarda. Tomado dessa decisão dirigiu-se ao conselho de arcanjos e solicitou a troca. Ponderou colocando as dúvidas de uma menina, tão pequena e sensível. Explicou a necessidade de um anjo especial para aquela menina tão esperta. Demonstrou sua paixão pelo amor dela à humanidade. Conseguiu seu intento.

     _ Mamãe, meu dentinho caiu!
     _ E você guardou filha? 
     _ Coloquei debaixo do meu travesseiro.
     _ Não minha filha. Me dê, eu quero guardar.
     _ Mas, mãe. Eu quero o dinheiro.
     _ O que você vai fazer com o dinheiro? 
     _ Vou te dar. Sei que você está precisando. Você está desempregada.
     _ Ah! Minha filha! Não precisa.
     _ Eu quero mãe.
     _ Tá bom, pode colocar.

     No meio da noite a mãe foi pegar o dentinho e fazer a troca. Ela teve uma surpresa. A troca já tinha sido feita.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Diário da Enfermeira Matilda


Personagens:
Gustavo - menino de sete anos, quieto, apático e calado.
Sr. Astolfo - velho de 99 anos, rabugento - reclama de dores o tempo todo, tem artrose, labirintite e usa bolsa de colostomia.
Mariana - mulher de 42 anos, nervosa, em TPM constante, sem vaidade e hipocondríaca.
Sr. Oswaldo - homem de 62 anos, metódico, arruma tudo o tempo todo e não gosta de sair de casa.
Gisele - mulher de 36 anos, bonita, artística, talentosa e vive à espera do noivo que não chega.

Matilda - Enfermeira de 45 anos, cuida dos pacientes: Gustavo, Sr. Astolfo, Mariana, Sr. Oswaldo e Gisele. Está nessa atividade há 20 anos, não se casou, não tem filhos e não vê a família.

Claudia - menina de 18 anos, revoltada com a família por diversas imposições, foge de casa. Os pais, sem saber o que fazer, a internaram.


Acontecimentos:
Cinco horas da manhã de mais um honrado dia de Nosso Senhor. Obrigada, Pai, por eu ter um trabalho e uma casa para morar. Pronto! Levantar-me-ei!

Sei que estou nessa rotina há 20 anos. Sei que não vejo a minha mãe há muito tempo. Sei que, por causa desse trabalho, não tive a oportunidade de me casar. Mas, agradeço, Senhor, por estar viva, ter uma casa - quase não fico nela - e um emprego.

Sete horas. Graças a Deus, consegui chegar na hora do início do meu plantão na Clínica Coração Feliz. Não sei se os corações estão felizes. Não sei se o meu coração está feliz.

Enfermeira: _ Bom dia, Gustavo! Vejo que conseguiu pegar o carrinho que caiu atrás da estante. Interessante como você gosta desse brinquedo. No seu aniversário, vou lhe dar um caminhão vermelho dos bombeiros. Você quer? (Silêncio) Como vou saber?

Enfermeira: _ Bom dia, Sr. Astolfo! Sua bolsa está cheia. Já venho trocá-lo. Volto logo! Não levo nem meia-hora. Calma, Sr. Astolfo! Eu sempre cumpro com o que falo, e o senhor sempre reclama.

Enfermeira: _ Bom dia, Mariana! Quer que eu penteie seus cabelos hoje? Não! Todos os dias, você me nega, mas não desisto de você. Já sei, sua cabeça dói e alguém mexeu nas suas coisas. Falarei novamente com os outros.

Enfermeira:_  Bom dia, Sr. Oswaldo! Tudo certo hoje?  Pelo que pude notar o senhor está com a camisa amarela própria das quintas-feiras. Ah! Deixou-a passada para ser usada hoje. Então, vamos dar uma volta no jardim? Não! Me negou de novo. Qualquer dia, eu consigo.

Enfermeira:_  Bom dia, Gisele! Que passo lindo o seu! É de qual ballet? Copélia. Eu devia ter imaginado. Que tal irmos ao Municipal no sábado? Não pode! De novo! Já sei, seu noivo pode vir a chegar. Vamos na próxima oportunidade.

Enfermeira: _ Bom dia, menina! Quem é você?
_ Meu nome é Claudia.
Enfermeira: _ Prazer, sou a enfermeira Matilda. Deixe-me examinar a sua ficha e verificar os motivos da internação. Esquizofrenia, tentativa de suicídio, drogas. Essa é você?
_ Não. Meus pais me colocaram aqui devido eu ter tentado fugir de casa. Quero a vida. Quero ser feliz. Quero viajar, estudar. Mas eles só permitem que eu siga ordens.
Enfermeira: _ Você tem certeza disso? Seus pais te amam? Pais sempre amam os filhos.
_ Eu sei. Mas, é um amor sufocante. Eu quero ser livre. Me ajuda.
Enfermeira: _ Como?
_ Me deixa sair.

Nisso, Gustavo, Sr. Astolfo, Mariana, Sr. Oswaldo e Gisele, todos olharam para a enfermeira Matilda. E Matilda também se assustou.

Enfermeira: _ Eu não posso!
Todos: _ É muito perigoso.

Enfermeira:_ Eu não devo!
Todos: _ Você pode ser assaltada.

Enfermeira:_ Eu posso ser demitida!
Todos: _ Você pode se machucar.

Claudia: _ Chega! Eu não me importo com o que possa me acontecer. Eu quero viver.

Nesse momento, foi como se um nó fosse desatado das mãos e pés da enfermeira Matilda. Pegou a menina Claudia pela mão e saiu da clínica onde os corações não são felizes.



Escrito por Simone da Silva Figueiredo
Livremente inspirado numa carta de Claudia Mazzolino
(08/03/2012)

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Um grão entre mil


Na cozinha da chácara o café é coado de manhã bem cedo. A mesa está posto o pão, a cuca de chocolate e a chimia de framboesa. O leite já fervido também ajuda a formar o coquetel de odores e sabores da manhã. Todos adentram a cozinha, marido, filho, filhas. Ela sabe que terá muito trabalho no dia de hoje, como em todos os dias, mas aproveita a cena por alguns segundos orgulhosa da família que formou. Então, leva o bule de café para a mesa.

Após muita balbúrdia, após o vanerão das xícaras, colheres, manteiga que dançaram sobre a mesa a fim de atender a todos, eles se foram. O silencio se instala novamente na cozinha. Cabe-lhe a tarefa de recolher tudo, lavar a louça, separar a carne do almoço. Tarefas rotineiras executadas com o prazer de ver o marido forte ir trabalhar e os filhos crescidos irem para a escola.

Em meio a tudo igual, o seu peito se aperta. Ela chega à porta da casa e vê sua irmã se chegando pelo caminho. O semblante estava pesado. Ela se preocupa e ansiosa caminha até a irmã. O seu alívio é tão grande quando a irmã lhe acalma dizendo que todos em sua família estão bem, que ela mal escuta o resto da história. Quando retoma a ciência das coisas, a irmã está lhe contando que o irmão delas se uniu a uma moça, mas que as crianças estão em situação de emergência por falta de alimentos.

As duas irmãs vão para a casa da chácara, apenas para deixar um bilhete, pegar dinheiro e alguns cobertores. Era uma manhã muito fria. Elas chegam ao local de morada do irmão e conhecem a cunhada. Esta informa não ter condições de criar as crianças e que o irmão delas não vinha para casa há muito tempo. A conversa é curta, a moça passa a guarda dos dois meninos a elas, as tias.

Sua irmã pega rapidamente com um dos cobertores o menino mais novo, de apenas seis meses. Ele estava muito magro e ela o protege. Para ela, olha de repente, um menino tímido, que tenta sanar sua curiosidade sobre as mulheres e se proteger na saia da mãe. O menino de um ano e meio sente medo do que não sabe. Ela vendo tudo isso nos olhos do menino se aproxima com cautela. Não quer espantá-lo. Ele, o menino, vendo o cuidado dela e tomado de curiosidade, sorri. É a senha para que ela se aproxime, o coloque dentro de um cobertor e em seus braços.

Ao chegar a casa, ela verifica espantada que o seu anjinho estava pequeno e magro. Ele ardia em febre. Ela improvisou um berço para ele numa das gavetas da cômoda e lhe preparou um caldo de galinha. E quando o anjinho adormeceu, ela rezou. Ela rezou por três dias consecutivos, o tempo da febre. Ela se interpôs na frente do marido, defendendo a criança e a nomeando de presente de Deus.

Seu anjinho cresceu, quebrou o braço, foi para a escola e tirou notas altas. Como todos os anjinhos fez birra, mas também deu muito orgulho. Um dia o anjinho voou para longe, foi morar em outra cidade.

Após quase trinta anos da chegada do anjinho em sua casa, numa tarde de primavera chegou outro anjo. O segundo anjo era uma moça já crescida. Diferente fisicamente dela, ela tinha olhos azuis e o anjo olhos negros, ela cabelos ralos e lisos e o anjo cheios e cacheados. A pela dela era alva e do anjo era negra. Ela falava alemão e o anjo falava português. As duas passaram dois dias juntas. Na linguagem do coração se entenderam e ficaram amigas.

O anjo de pele negra sou eu. Ela era a minha sogra. Contou-me essa história e me mostrou a gaveta-berço e me disse o quanto amava o filho-anjo. Mas, o verdadeiro anjo é essa senhora que amou, criou e deu seu coração a mais um filho.

Autor: Simone da Silva Figueiredo
(Escrito em 04 de janeiro de 2012)