sexta-feira, 18 de outubro de 2013

O gato, o passarinho e a borboleta

Certa casa assobradada com uma bela varanda na frente recebeu novos moradores. O jovem casal com crianças a alugara a fim de curtir a primavera. Ao chegarem ao endereço perceberam a beleza do local, a decoração de acordo, e o gato. Um gato amarelo e esguio que os aguardava na varanda.

Ao entrarem, o gato os seguiu de longe. Observaram a casa, se dividiram pelos cômodos. Foram às compras. Retornaram com um pacote de ração para gatos, sabor salmão defumado. Ração de boa qualidade.

Nos primeiros dias as crianças tentaram brincar com o gato, mas esse era arredio. Passadas três semanas o gato já estava sentando nos colos e pedindo cafuné. Depois de dois meses, o gato era peça da mobília. Mesmo assim, por três vezes ao dia, o gato recebia ração.

O gato gostava de ficar pelas manhãs ensolaradas deitado na varanda. Observava, com segundas intenções, o passarinho amarelo que estava a construir um ninho na ponta do telhado. Mas, sempre que o passarinho se distraia e ficava no ponto para o bote, surgia uma borboleta azul. A borboleta azul bailava na sua frente, o gato encantado pela borboleta, esquecia-se do passarinho.

Ao término da primavera, a família partiu. A casa ficou a espera de um novo grupo. A tigela da ração ficou vazia. O gato estava deitado na varanda. O passarinho se distraiu. A borboleta apareceu. E o gato deu o bote no passarinho e na borboleta.


Simone da Silva Figueiredo &
 Renato Möller
(Escrito em 18 de outubro de 2013)

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Estrela – Nova e Supernova

Alguns observadores celestes eram levados no passado a acreditar que as estrelas surgiam no céu, nasciam. A transferência de matéria de uma estrela maior para uma estrela menor, devido a proximidade, provoca um fenômeno, uma explosão. Tal fenômeno provocava a crença do nascimento de uma nova estrela.

Quando um homem apaixonado se aproxima de uma mulher, também apaixonada. A aproximação gravífica promove a transferência de matéria da estrela maior – mãe – para a estrela menor, interna a ela – filho. Num dado momento, em torno de nove meses, a estrela mãe se torna instável – entra em trabalho de parto – e a explosão lança no espaço parte do material da estrela mãe – nasce uma criança.

Em 1913, nasceu uma criança estrelar. Veio com uma missão especial – brilhar. Por onde passou plantou sorrisos, encantamentos e alegria. Cresceu um menino encantador, a alegria de seus padrinhos. Quando estes faleceram retornou ao lar materno e se tornou a alegria dos pais e irmãos. Cresceu um pouco, ele era uma pequena estrela, e foi trabalhar. De dia era a alegria dos colegas de trabalho, não importavam as dificuldades, tinha um sorriso para todos. A noite um espetacular dançarino.

A estrela se tornou um garboso rapaz. Não era namorador, era encantador. O seu brilho prendeu-se ao de uma mãe d’água. O rapaz se apaixonou por uma índia. Viveu ao lado de sua sereia das águas amazônicas por 35 anos. Nesse período tornou a vida dos amigos, da família e da esposa especial. Quando a sereia voltou para as turvas águas do Rio Negro. A estrela voltou a bailar pelos salões. E num início de 1999, após confessar a neta, que ainda era apaixonado por sua sereia, partiu para a eternidade.

Quando uma estrela gigante chega ao fim da sua vida produz uma explosão tão intensa que é similar à explosão de uma galáxia inteira. Para sermos estrelas gigantes da vida temos de cultivar o encantar, o amar e o querer bem.

No enterro da estrela um dos funcionários do cemitério exclamou: “Deve ser um político importante, tem muito tempo que não vem tanta gente para um enterro”.

Uma grande estrela após sua explosão pode se tornar um pulsar – uma área que emite energia constante. Hoje, a estrela faria cem anos. Sinto saudades.

Escrito por Simone da Silva Figueiredo
(em 23 de Setembro de 2013)

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Abandono

No despertador estrategicamente colocado ao lado da cama, o visor indica 05:30 – a alvorada.

Ela se levanta, meio trôpega, vai para o banheiro e inicia a rotina de asseio diária. Escova os cabelos, prende-os na touca, banho rápido de cinco minutos e escova os dentes.

No quarto, dia a dia os mesmos passos. Creme hidratante, desodorante, roupas intimas e roupa de escritório.

O despertador a traz de volta ao planeta, agora são seis horas. Acordar as meninas. Um breve pensamento grita: “Elas e eu queremos dormir”.

Arruma as crianças, leite no copo e pão no prato, lancheiras arrumadas, uniformes e penteados verificados. São sete horas, elas partem. A moça do transporte chegou.

Na rotina cadente tal qual pêndulo de relógio de parede, os afazeres não podem esperar. Não pode cochilar. Arruma as bolsas e sai.

Caminha.
Pega o trem.
Caminha.
Pega o ônibus.
Bate o ponto.
Trabalha.
Almoço.
Trabalha.
Bate o ponto.
Caminha.
Pega o ônibus.

Cumprimenta a recepcionista no segundo emprego. Reunião, ordens, reunião – não necessariamente nessa ordem.

Sai.
Caminha.
Pega o Metrô
Pega o Trem.
Caminha.
Entra em casa.

Retorno a balburdia amada. Verifica os deveres de casa, ouve as histórias. Conta histórias para dormirem. Às vezes, cochila.

Senta ao computador.
Trabalha.

O relógio marca 01:00. O serviço não terminou. O sono venceu.
Toma uma chuveirada morna. Coloca a camisola e deita.
Então, a coberta de algodão cru toca o seu corpo e sussurra baixinho: “Você está sozinha. Boa Noite!”.



Escrito por Simone da Silva Figueiredo em
13 de setembro de 2013 – 10:07

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Homens! Vinhos ou Quadros?

       Alguns esclarecimentos são necessários antes de embarcar nas minhas indagações. Não pretendo mencionar qualquer representante de nossa espécie do sexo masculino que eu tenha conhecido. Não se trata de um texto sobre os ‘ex’ ou aqueles que poderiam ter sido.

Esse texto incide sobre questões da minha adultice[1]. Sobre a dúvida que se instalou em meu coração em 1993 e, após vinte anos, encontra-se dissipada. Anne Rice lança o aclamado livro “Entrevista com Vampiro”. Amo, ainda, esse tema. Consegui-o emprestado. E tomada de uma fúria insana, li. Eu li o livro em oito horas.
Ler o livro não resolveu a loucura, só me deu combustível. Aliado aos rumores da venda dos direitos do livro para o cinema. Veio à vontade de saber quem interpretaria Lestat e Louis.
Nesse momento deve vir a vossa cabeça o questionamento sobre no que essa história de amor à literatura se relaciona com o título. A relação está com Brad Pitt e Tom Cruise. Eu era apaixonada pelo Tom Cruise e mal conseguia lembrar o nome do Brad Pitt. Eu amava o Tom Cruise. Mas, passaram-se os anos e Tom continua igualmente lindo. Tão lindo que parece um quadro pendurado em minha parede. Também, com esse filme, tomei conhecimento de  Brad Pitt. Não tinha visto atuações anteriores. Era a minha estreia com Brad Pitt. Brad era tal qual um quadro de Monet, lindo e para ser visto a distancia.
Nesses vinte anos, descasei, casei de novo e descasei novamente. Encontrei tesouros extremamente preciosos e vários amigos de incontável valor. A vida seguiu o fluxo. Assisti uma lista extensa de filmes. Vi todas as ‘missões impossíveis’ e ‘os homens e seus segredos’. Vi filmes com Tom e com Brad.
Hoje me pego olhando para o Tom como o quadro na parede. É bonito, mas não me acompanhou. Olho para o Brad e vejo a marca do tempo no canto dos olhos, na voz e no olhar. Brad envelheceu comigo. Brad é um vinho. Refleti sobre esses homens e conclui. Quero homens que me acompanhem tanto na tela como na vida.
(Escrito por Simone da Silva Figueiredo, 03 de maio de 2013)



[1] Expressão usada pela autora para definir uma fase da vida quando o indivíduo não é mas adolescente, mas, também, não é um adulto pleno. Uma fase transitória entre estas.

terça-feira, 14 de maio de 2013

Sintomas da Chatice

 (uma doença incurável, mas tratável)

Prazer de falar desproporcional ao prazer de o interlocutor de ouvir.
Uso desautorizado da atenção do interlocutor como oportunidade para construir/lapidar um pensamento.
Exercício, legítimo ou não, da cobrança.
Ausência do senso de conveniência.
Compulsão a oferecer conselhos não solicitados.
Recurso a exemplos desnecessários (detalhes irrelevantes).
Hábito de interromper o fluxo de uma conversa coletiva com intervenções não cabíveis, destinadas apenas a destacar um feito de que tomou parte ou uma experiência pessoal.
Teatralidade da exposição de um tema.
Não entendimento de que o silencio não é necessariamente falta de assunto.
Hábito de explicar o autoexplicável.

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Esse conjunto de características foi formulado por Renato Möller em uma tarde de absoluta falta do que fazer.  A título de dar a minha contribuição para erradicar este mal que atinge indistintamente uma grande parcela da população, converto tais características numa metodologia, concebida após anos de verificação empírica e a exponho abaixo na intenção de proporcionar aos leitores desse blog condições precisas de realizar um autodiagnóstico.

Se você tem apenas um ou dois dos dez sintomas, você ainda tem chance.
Se você tem de três a cinco sintomas, não aceite convites para jantar.
Se você tem de seis ou sete sintomas, só saia de casa amordaçado.
Se você tem de oito ou nove sintomas, estude a possibilidade de virar eremita.
Se você tem os dez sintomas, o HaraKiri pode ser uma solução.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Manual dos 40


O momento que você tem plena noção da chegada da quarta década da vida é aquele que a consciência de que a juventude te abandonou assenta sobre sua cabeça como um quipá. Observa-se o corpo no espelho e o reconhecimento de quem foste lhe é ainda fácil, mas não mais imediato. Mesmo que a imprecisão lhe ocorra, e não consiga descrever com clareza as alterações, elas se fazem presente na sua imagem e na sua consciência. A negação, deste momento em diante, passa a ser uma mentira quando dantes era apenas uma distração.
O corpo, que saudade do meu corpo de duas décadas atrás. Que saudade das minhas preocupações de outrora. Que saudade de ocupar o meu tempo apenas com aquilo que era importante para o meu futuro. Como era bom poder ser egoísta.
Aos 40 é necessário ampliar o leque das preocupações, e, consequentemente, reduzir as expectativas, os sonhos egoístas. Os sonhos passaram a ser possibilidades que outra pessoa poderá vir, se tiver vontade, possibilidade e oportunidade, realizar.
O mundo continua sendo vivo e vibrante, mas a urgência pertence aos outros. A vontade de correr continua presente, mas o tornozelo, joelho, nervo ciático, pé de atleta etc. não mais permitem. Cabe apenas escolher, com muito critério, a corrida na qual você se inscreverá. Mas, é impossível correr o circuito das quatro estações. Pois, como dantes dito, é preciso priorizar suas escolhas, a inexistência de energia cinética, combustível e outras provisões impedem de participar de todo o circuito. Aquele desejo de correr o Raly Paris-Dakar terá de ficar para a próxima encarnação.
Contente-se. Mesmo porque se a escolha recair na tristeza, isso não retardará o processo, provavelmente o acelerará. Existem prêmios nessa fase se não permaneceres observando a porta dos fundos de sua casa emocional. Ao sentar na varanda, caminhar pelo jardim e conhecer a vizinhança perceberá que essas quatro décadas trouxeram amizades, experiências, histórias, amores, vida. Encontrará nessas emoções toda a provisão necessária para o restante da jornada, sem que tenha necessidade de previamente saber o tempo da aventura.
(Escrito por Simone da Silva Figueiredo, 10 de março de 2013)

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Quero ser ...


Acordei hoje pensando no que eu quero ser e no que tenho talento, habilidade, sei lá essas coisas. Eu sou comunicativo, tenho equilíbrio emocional e me interesso pelos sentimentos humanos.

- Filho, eu preciso falar com você!
- Tá mãe só um minuto.

Continuando, tenho autoconfiança e autocontrole. Aliado a isso possuo uma grande capacidade de análise, de comunicação, concentração e observação.

- Filho, vai demorar? Preciso da sua ajuda.
- Esperaaaaaaaaaaaaaa! Só mais um minuto.

Onde eu estava? Ah! Lembrei. Sou curioso, gosto de ajudar as pessoas, discreto e com bastante equilíbrio emocional. Tenho todas as qualidades elencadas naquele site de profissões. Eu posso ser psicólogo.

- Filhoooooooooooo! Eu preciso conversar com você. Vem aqui, agora!
- Poxa, mãe! Eu estou pensando na minha vida. Isso é muito importante. Não pode esperar?
- Filho, eu achei seu boletim. Isto me informa que você repetiu em matemática, física e química. Como você explica isso?
- Mãe, você tem de entender que o pensamento matemático não se encontra na minha lista de habilidades natas e nem eu tive tampouco possibilidade reais de desenvolvê-lo. Por outro lado, passei em português, retórica e educação física com notas altíssimas.
- Filho, se você não for bom em matemática você não consegue ser engenheiro.
- Mãe, eu estava pensando justamente nisso. Eu não quero mais ser engenheiro, agora eu quero ser psicólogo. Tenho todas as características desejáveis da profissão.
- Filho, todo psicólogo é maluco. E, também, existem poucos malucos com dinheiro para pagar uma consulta. Eles, os malucos, se tratam no hospital público. E o serviço público paga mal.
- Mãe, eu sou altruísta. Estudarei para me formar numa profissão na qual eu possa ajudar o povo. Pois, somente querendo o bem do próximo poderei ser feliz. Dinheiro não é importante. Importante é a felicidade que se pode promover nos nossos semelhantes.
- Tudo bem, filho. Você me convenceu.
- Mãe, você me ajuda a contar a notícia para o papai?
- Qual notícia filho? A que você não quer mais ser engenheiro e que quer ser psicólogo?
- Também, mãe. Quero contar essa e a que reprovei em matemática. Ajuda-me?
- Tudo bem, eu converso com ele para você.
- Te amo, mãe.

Pensando melhor, acho que eu devo investir na política. Já convenci a primeira pessoa.